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Eleito Presidente, Juscelino, ao partir em viagem à Europa e aos Estados
Unidos, antes de sua posse, fez chegar ao governador de Goiás solicitação
para que os goianos se encarregassem de minutar os atos legislativos
que lhe permitissem levar a termo a empreitada de transferir a Capital.
Ponderava que os goianos haviam enfrentado e superado problema semelhante,
pouco tempo antes, na construção de sua nova Capital, Goiânia, e deviam
saber das coisas. Juca Ludovico, o governador, passou a tarefa a Segismundo
de Araújo Mello, José Peixoto da Silveira e Paulo Fleury Silva e Souza.
Quando a minuta ficou pronta, foi levada a Israel Pinheiro. Juscelino
ainda não voltara da viagem e havia a recomendação de que o assunto
fosse tratado com o deputado mineiro.
A minuta criava uma "Comissão", subordinada diretamente ao Presidente
da República. Israel pediu que a refizessem, transformando a "Comissão"
em Autarquia.
No seu regresso da viagem, Juscelino decidiu entregar o exame das
minutas e a responsabilidade pela elaboração final dos instrumentos
legais ao jurista San Tiago Dantas.
Houve então, poucos dias após a posse, uma reunião no Catete, a que
compareceram os líderes dos Partidos que apoiavam o Governo no Congresso,
o Presidente da Comissão de Mudança da Capital, o Governador Juca
Ludovico, San Tiago Dantas, Israel e outros.
Nesse encontro Juscelino reafirmou o seu propósito de transferir a
Capital ainda no seu qüinqüênio presidencial e pediu a ajuda de todos,
a partir da aprovação legislativa dos atos que nesse sentido encaminharia
ao Congresso Nacional. Segismundo Mello, que acompanhava o governador
Ludovico, trazia no bolso o anteprojeto de criação da Autarquia.
Mas San Tiago propôs uma "empresa pública" em que a União seria a
única acionista, nos moldes da Petrobrás, e seus argumentos convenceram
a todos. Terminada a reunião os presentes dirigiram-se ao escritório
do professor San Tiago, onde prosseguiram na discussão do assunto,
tendo em mãos as sugestões do anteprojeto goiano. San Tiago, ao final,
encarregou Segismundo de esboçar o novo instrumento, incorporando
o que se havia então decidido.
De posse da minuta final, lhe deu forma definitiva e a entregou a
Juscelino. Era um instrumento que concedia ao Presidente amplos poderes,
eliminando a necessidade de providências legislativas futuras, que
levariam, seguramente, ao impasse, à interrupção das obras, ao insucesso
da iniciativa.
De posse do trabalho preparado por San Tiago Dantas, Juscelino encarregou
Christiano Martins, Secretário da Presidência, de redigir mensagem
encaminhando o projeto de lei ao Congresso Nacional.
A pedido de Israel, Segismundo Mello levou ao Christiano elementos
que poderiam interessar à fundamentação da mensagem. Na tarde em que
Juscelino deveria assinar o documento, encontravam-se os dois trabalhando
na sala de Christiano, no 1° andar do Catete.
Ao ouvir de Israel a informação de que o Presidente, após assinar
a mensagem, viajaria naquela mesma noite ao Amazonas para uma visita
ao poço petrolífero de Nova Olinda, há pouco descoberto, Segismundo
lembrou que, se o Presidente em vez de assinar a mensagem no recolhimento
do seu gabinete, aproveitasse a escala em Goiânia para assiná-la em
solenidade pública, estaria não só prestando justa homenagem ao povo
goiano, sempre ativo na 1a linha da luta pela interiorização da Capital,
como também atribuindo ao ato importância que lhe daria repercussão
nacional.
Juscelino era muito de se sensibilizar com sugestões como essa, mas
ponderou que não via maneira de avisar o Governador para as providências
necessárias.
Segismundo assegurou ao Presidente que dentro de 5 minutos o Governador
já estaria avisado, surpreendendo Juscelino com a informação de que
existia um serviço de rádio-telefonia ligando Goiânia ao Rio de Janeiro.
O Presidente acabou concordando.
Levado o fato ao conhecimento de Ludovico, Goiânia empolgou-se e pelo
resto da tarde e por toda a noite mobilizou-se para o grande ato.
As estações de rádio convocavam o povo, carros com auto-falantes percorriam
as ruas, o Palácio das Esmeraldas se encarregou de avisar às autoridades.
Foi uma noite de vigília e festa. De madrugada a multidão concentrou-se
no aeroporto, aguardando o Presidente.
Juscelino saíra do Rio por volta das 23 horas. A Bancada de Goiás
no Congresso lhe enviara um telegrama de apoio e cumprimentos, assinado
por todos os Deputados e Senadores, sem distinção de partido.
Mas estava escrito que a assinatura da Mensagem não se daria em Goiânia.
O avião alcançou essa cidade alta madrugada. Na penumbra do amanhecer
podia-se ver o campo de pouso inteiramente coberto por forte cerração.
O velho avião da FAB não possuía equipamento que lhe permitisse o
pouso cego. E assim, depois de sobrevoar Goiânia por algum tempo,
rumou para Anápolis, cidade próxima.
Seriam 5 horas quando o Presidente desceu do C-47, acompanhado de
sua comitiva. O Tenente João Luiz e Silva, Chefe do Destacamento da
FAB que guardava o campo, foi ao encontro do grupo e levou a todos
para um barzinho. Juscelino surpreendeu-se ao encontrar tantas pessoas
reunidas àquela hora no aeroporto. E não era por mero acaso que se
encontravam ali. Na verdade haviam aguardado a noite inteira, acompanhando
através do serviço de rádio da FAB a viagem do Presidente. Alimentavam
esperanças de que pudesse acontecer o que acabou acontecendo.
Conheciam o aeroporto de Goiânia, construído numa região baixa e úmida
à margem do rio Meia-Ponte e sabiam que de madrugada, quase sempre,
forte cerração cobria tudo, impedindo os pousos e decolagens.
O Presidente explicou aos presentes que não tendo podido descer em
Goiânia assinaria em Anápolis a Mensagem ao Congresso encaminhando
projeto de lei que dispunha sobre a mudança da Capital. Exaltou a
importância do ato, riscou da mensagem a palavra Goiânia, escreveu
Anápolis, datou de 18 de abril de 1956 e assinou, entregando a caneta,
como lembrança, a um dos presentes. Solicitou ao Deputado Pereira
da Silva, de sua comitiva, que lavrasse uma ata da imprevista solenidade,
documento que assim ficou redigido:
"Às 51/2 da manhã, nesta cidade de Anápolis,
Estado de Goiás, em 18 do mês de abril de 1956, S. Excia. o Sr. Dr.
Juscelino Kubitschek de Oliveira, Presidente da República, leu e assinou
a mensagem dirigida por S. Excia. ao Congresso Nacional, em que pede
seja decretada a mudança da Capital da República para a região do
Planalto Central para esse fim escolhida na área em que construirá
o futuro Distrito Federal. Para que conste dos anais da Câmara Municipal
de Anápolis, o Deputado Federal pelo Amazonas, Dr. Francisco Pereira
da Silva, Presidente da Comissão Parlamentar da Mudança da Capital,
da Câmara dos Deputados, lavrou esta ata que vai assinada por S. Excia.
o Sr. Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira e pessoas presentes.
Anápolis, 18 de abril de 1956. "
Assinaram a ata, pela ordem: Juscelino Kubitschek, Coroacy Nunes,
João Kubitschek, Pe. Pedro Maciel Vidigal, Dilermano Paulo Silva (Major),
Pereira da Silva, Érides Guimarães, Amador Abdala, João Luiz e Silva,
Expedito Verçosa da Cruz, Ramze Falluh, Armando Xavier, João Batista
Jaime, Edson Barbosa da Silva, Geraldo Monteiro da Silva, Geraldo
Guttemberg Soares, Francisco Alves Pereira, José Venceslau Gomes,
Sebastião de Oliveira, Misael de Castro Dourado, José Cândido da Silva,
Edelvício Arner de Souza, Juvenal Mendanha Santana.
Na verdade, nem todos os que assinaram a Ata estiveram presentes à
sua lavratura naquela madrugada de abril. Alguns pediram, depois,
para assinar, no desejo de figurar no histórico documento.
A ata foi entregue a Érides Guimarães, juntamente com uma cópia da
Mensagem, para transcrição nos anais da Câmara Municipal de Anápolis.
Juscelino telegrafou, em seguida, ao Governador Juca Ludovico, justificando-se
por não haver pousado em Goiânia e informando que assinara em Anápolis
a Mensagem, propondo "medidas decisivas" para a mudança da Capital
da República.
O Presidente prosseguiu viagem rumo a Manaus, levando na pasta o original
da Mensagem, que Álvaro Lins, Chefe do Gabinete Civil da Presidência,
encaminharia, no dia 23 daquele mês, à Câmara dos Deputados, através
de ofício dirigido ao 1° Secretário da Casa, Divonsir Cortes.
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